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Escritório muito frio ou quente gera cansaço e problemas de saúde

A temperatura no ambiente de trabalho durante o verão deve ficar entre 23ºC a 26ºC, segundo resolução da Anvisa. Mas quem disse que essa norma acabou com as disputas entre funcionários friorentos e calorentos pelo controle do ar-condicionado?

Em busca do próprio conforto térmico, há quem desligue os aparelhos sem abrir as janelas ou abaixe a temperatura ao mínimo possível. Isso pode desequilibrar o clima e levar a extremos, causando infecções respiratórias, alergias e queda no rendimento.

“O conforto está relacionado ao equilíbrio do corpo humano. Um ambiente de trabalho agradável deve ter a temperatura de acordo com a norma, uma renovação de ar frequente e umidade de, no mínimo, 40%”, explica o médico Kleber José Campos, conselheiro científico da APMT (Associação Paulista de Medicina do Trabalho).

Suor, irritação, falta de disposição e saídas constantes para “tomar um ar” são situações bastante conhecidas pelos calorentos.

A endocrinologista Laura Ward, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, explica que espaços muito quentes, assim como os muito frios, geram um gasto energético no corpo para que ele se adapte à temperatura externa. Neste caso, com a transpiração.

“Com isso, sobra menos energia para outras funções do organismo, afetando aquelas ligadas ao sistema nervoso central, como a concentração”, explica.

O estudante de relações públicas Lucas Menezes, 22, sabe bem o que é isso. Ele chega às 11h ao estágio, em uma start-up de cupons para compras on-line, e liga todos os aparelhos de ar-condicionado do lugar a cerca de 20ºC.

“O calor me deixa indisposto e, às vezes, dá até dor de cabeça. Preciso do aparelho em uma intensidade forte”, diz ele. “Talvez porque eu seja gordinho.”

A atitude não agrada em nada a publicitária Luíza Cardoso, 25, sua colega de trabalho. Ela chega ao escritório às 8h e, até a chegada de Menezes, mantém o ar desligado. “O frio me causa muito desconforto. E nem consigo esquentar as mãos porque trabalho digitando”, diz.

A solução encontrada pelos dois foi trocar de lugar entre si. “Melhorou bastante”, garante ela, que tem sempre um casaco a tiracolo. Com a chegada do verão, porém, a situação deve ficar pior para Cardoso. “É a época em que as pessoas exageram no frio.”

POLO NORTE

Segundo um estudo publicado pela Universidade Cornell (EUA), em 2004, funcionários tendem a cometer mais erros em escritórios e lugares com temperaturas mais geladas. A pesquisa mostrou que, quando a temperatura passa de 20ºC para 25ºC, os erros de digitação caem 44% e a produtividade aumenta em mais de 100%.

“O frio leva ao aumento de movimentos involuntários do corpo para que seja aquecido, como os tremores, e à perda dos voluntários, o que dificulta o movimento dos dedos e atrapalha a digitação”, explica Campos, da APMT.

Temperaturas muito frias no trabalho também podem afetar a saúde dos funcionários, levando a infecções respiratórias e à piora de alergias, explica José Eduardo Cançado, presidente da SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia).

“O corpo vai gastar mais energia para manter temperatura interna e, com isso, sobra menos para as células de defesa, reduzindo a imunidade”, explica. Gripes, sinusites e amigdalites estão entre as consequências.

Além disso, o frio deixa o ar mais seco, o que causa o ressecamento das mucosas e piora alergias respiratórias. “É importante aplicar soro fisiológico de duas a três vezes por dia para umedecê-las”, afirma o pneumologista.

Oscilar entre lugares frios e quentes ao longo do dia é também um problema, afirma Cançado. “O corpo não consegue se adaptar a mudanças bruscas de clima, aumentando o risco de crises respiratórias.”

A assistente de comunicação Laura Loyo, 22, funcionária de uma start-up de educação a distância, teve que trocar de lugar após ficar com dor de garganta por causa do ar-condicionado. “Foi uma decisão triste, eu gostava muito da minha mesa porque ficava do lado da varanda e a internet nunca caía”, diz. “Agora, estou quentinha.”

Antes disso, os conflitos com seu chefe por causa do frio eram frequentes. “Tenho trauma de calor porque, no primeiro escritório da empresa, não havia ar-condicionado. Ele me dá moleza e desânimo”, afirma o publicitário Gustavo Uehara, 31.

A temperatura do escritório costuma ficar em torno de 20ºC. “Quando há conflitos, tentamos resolvê-los. Não é porque sou gestor que tenho direito de impor o clima que eu quero”, afirma.

MUDAR TEMPERATURA SEM CONSULTA PODE AFETAR IMAGEM DO FUNCIONÁRIO

Desligar ou ligar o ar-condicionado sem consultar os colegas, além de não ser educado, pode prejudicar a imagem de um funcionário na empresa, afirma Maria Aparecida Araújo, especialista em comportamento profissional e dona da consultoria Etiqueta Empresarial.

“O comportamento perante as situações mostra que tipo de profissional você é. Quem adapta a temperatura a si mesmo mostra egoísmo, rigidez e falta de adaptabilidade”, diz. “Por outro lado, aquele que sente frio ou calor e se protege mostra altruísmo, tolerância e resiliência, qualidades valorizadas no mercado”, acrescenta.

Outro comportamento que pode ser negativo para o funcionário é reclamar o tempo inteiro sobre o clima. Segundo Araújo, é preciso ter uma certa discrição e não ficar se abanando ou esfregando o braço para se aquecer. “Ninguém tem culpa se você saiu de casa com a roupa errada.”

O diálogo é fundamental antes de fazer qualquer alteração, ressalta Yeda Moraes de Camargo, especialista em comportamento organizacional da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

“O incômodo é geral? As pessoas concordam com a mudança? É preciso fazer essas perguntas”, afirma.

A participação do chefe na negociação nem sempre é fundamental, diz. “Há situações que podem ser resolvidas com conversa entre os colegas e não precisam ser levadas ao gestor”. Mas ela defende que chefes peçam sugestões aos funcionários.

 

fonte: Folha